Frater Optimus, o mago das antigas, está na idade do “me processe”, e fala o que bem entende por aí. É claro que é importante ouvir a voz da experiência, mas às vezes ele está um pouco… deslocado no tempo.
Na coluna de hoje, ele fala de um conceito que não é novo, mas que o pegou de surpresa: o famigerado choque de egrégora.
Era só o que me faltava. Além de subverterem o bom senso, esses jovens de hoje em dia estão querendo subverter até o dicionário. O cúmulo do ridículo é essa gente que não sabe de nada, mas quer falar bonito, impressionar, parecer inteligente. E acaba falando asneiras memoráveis. Algumas dessas asneiras vão ganhando massa crítica, e quando você menos espera, lá está ela, sendo usada por uma quantidade enorme de imbecis – e chega até ao ponto de mudar de significado. Por exemplo, ninguém sabe direito o que “egrégora” significa, mas hoje em dia todo mundo adora falar essa palavra. E pior ainda – mesmo sem saber usar a palavra direito, decidem elaborar ainda mais em cima dela, e acabam criando todo um novo conjunto de expressões. A da moda agora, ao que me parece, é o tal choque de egrégora. Francamente…
Para elucidar o que eu quero dizer, vamos ver o que o dicionário acha que é uma egrégora:
egrégora – e·gré·go·ra – sf – (1) Aura de um local onde ocorrem reuniões de grupo. (2) Aura de um grupo de trabalho. (3) Somatório de energias mentais, criadas por grupos de pessoas ao se concentrarem com força vibratória.
Michaelis, Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa
A maioria das pessoas que usa essa expressão sem saber do que se trata são os Mestres da Internet e seus discípulos ainda mais boçais. E, como essa gente não produz conteúdo referenciável, é difícil achar uma definição escrita que tenha saído da boca (ou dos dedos) de algum desses nobres senhores. Mas o venerável e sábio mestre Bruno Borges martela, em sua obra-prima:
Quanto mais informações linguísticas transformarmos por meio da nossa interpretação, mais conteúdos serão absorvidos, gerando uma “egrégora”, e quando um indivíduo se alimenta dessa “egrégora”, esse acúmulo de informações deixado pela história consegue alcançar um número excessivo o suficiente para lhe ser digno de ter alcançado certa complexidade e maior é a chance de gerar novas informações, compartilhar com seus semelhantes e deixa-las no mundo ao seu redor para serem absorvidas pelos órgãos sensoriais dos seus irmãos.
Bruno Borges – TAC – Teoria da Absorção do Conhecimento
Entendeu alguma coisa? Não é vergonha dizer que não. O Mestre Bruno não faz nenhum sentido para mim, não precisa fazer para você.
Mas, voltando à vaca fria, que terror. Chegamos ao dia em que os dicionários não valem mais de nada. O que está errado: o dicionário ou o jovem mestre das artes ocultas? Um dos dois não sabe o que está falando. Eu acho que sei quem está certo e quem está errado. E tenho certeza que você, caro leitor, sabe o que eu acho.
Tudo bem, temos então uma diferença grotesca entre essas duas definições. Isso não é alarmante – para que haja uma diferença tão brutal, basta uma única pessoa burra em ação. O que me incomoda, na verdade, é que a maioria das pessoas que usa a palavra “egrégora” a torto e a direito por aí considera que ela significa alguma coisa no meio desse espectro.
Isso quer dizer que, se ou o dicionário ou o Grande Sábio Assexuado estiverem certos (e basta um deles estar certo!), todas essas pessoas estão, invariavelmente, erradas.
E é com base no uso indefinido de conceitos e expressões que começam os maiores absurdos da comunicação. E uma dessas maluquices que eu acho mais engraçadas – para não dizer tristes – é o tal choque de egrégora.
Em pouco tempo, ouvi tanta gente falando tantas abobrinhas e despautérios sobre choque de egrégora que nem vou conseguir lembrar de todas. Mas resumindo a crença geral, as pessoas acham que uma egrégora (seja lá o que isso significa para elas), quando exposta a outra, inicia automaticamente um conflito mágico/energético. As pessoas envolvidas em tal choque sofrem as consequências desse conflito. Essas consequências incluem mal-estar físico, coisas ruins acontecendo de forma aparentemente coincidente, e até prejuízos irreversíveis ao corpo de luz (!). E o resultado final do choque, segundo a crença popular, é pré-estabelecido: uma egrégora mais forte sempre vai vencer uma outra mais fraca – com maior ou menor grau de dificuldade.
Você tem noção do quanto isso é ridículo? Pare para pensar.
Estou esperando.
Pensou?
Pois então. É realmente ridículo, não é? Isso quer dizer que o satanista que entra numa igreja católica para prestigiar o batizado do sobrinho recém-nascido está fadado a virar enxofre assim que atravessa o batente da porta? Que o segurança evangélico vai começar a vomitar sem explicação se for trabalhar em um desses shows de rock pauleira que as crianças gostam? Que a macumba feita na encruzilhada perto da igreja não funciona?
Viu o quanto isso é ridículo?
Eu vou te contar em que situações eu acho que esse negócio de choque de egrégora se aplica, mesmo que eu não concorde com a terminologia. Isso se aplica, por exemplo, se você mistura coisas opostas na sua prática mágica ou religiosa. (Ou no seu paradigma, se quiser usar outra palavra que ninguém entende.) Por exemplo, não vejo nenhum mal em sincretizar – usar símbolos ou entidades similares de panteões diferentes para chegar a um resultado coerente. Mas não acho que vá dar certo, por exemplo, fazer uma evocação goética de Jesus Cristo. Não acho que o operador que tentar fazer isso vai cair duro no chão, fulminado, irremediavelmente danificado, punido por sua ousadia. Acho apenas que não vai funcionar. E pronto.
Esse pessoal exagera demais. Tem paranoia demais. Não entende patavinas e fica botando complicações e dificuldades na prática dos outros. Não seja assim. Tente ser coerente. Não encha o saco dos outros. Não fique fazendo terrorismo psicológico.
E você achava que dicionário é só um livro grande pra enfeitar a estante? Achou errado. Otário…
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